quarta-feira, 2 de maio de 2018

Era um entardecer de sexta feira. Dirigia rumo a um lugar qualquer, para uma situação que não lhe interessava muito. O caminho em si, por outro lado, tornou-se seu maior entretenimento. Gostava de passar por aquelas vias, sempre observando as pessoas caminhando, os outdoors comerciais que insistiam em tentar convencer e, ainda, aqueles apartamentos que começavam a se iluminar à medida que o sol ia se pondo. Gostava do contraste entre as luzes acesas de alguns apartamentos e apagadas de outros. Sempre se concentrava primeiro naqueles sem luz e perguntava onde estariam aqueles que não poderia observar. Em sua cabeça, imaginava muitas vidas e infinitas possibilidades. Talvez tenham viajado e estejam vivendo deliciosos momentos ao lado de suas famílias; talvez, ainda presos no escritório, estejam terminando o último projeto de sucesso; quem sabe não puderam sair porque salvavam vidas.
O caminho, por si, não demorava muito. Tão logo chegava, aquelas imagens e possibilidades logo se dissipavam na usual rotina do ser humano. Absorto em seus afazeres, tinha pouco tempo para pensar naquelas vidas ao longo do dia. Porém, tão logo o sol se punha e dirigia-se para seu descanso, aquelas imagens rondavam-lhe a cabeça.
Gostava, especialmente, de observar os grandes apartamentos envidraçados, que permitiam uma rápida olhava. Comumente, conseguia ver pessoas, porém lhe chamava muita atenção as oportunidades festivas. Via pessoas se cumprimentando, curtos abraços, vários diálogos. Já não pensava muito em quem seria, somente comparava aqueles momentos com os seus.

Sem que percebesse, tentava participar daqueles momentos mesmo que de longe. Nunca parou para pensar, no entanto, que só projetava vidas perfeitas, vidas que gostaria de ter tido... Nunca pensou que o trabalho pudesse ser a experiência mais estressante de um, que  outro vivesse um pequeno martírio todo dia que chegava em casa, ou que alguém sofresse pelo simples fato de sofrer. Na tentativa de participar da suposta vida perfeita que não tinha (nem ninguém), esqueceu a sua e, quando se deu conta, já não tinha mesmo.